3-Gatsu no Lion (March Comes in Like a Lion) é um anime psicológico, com foco em drama e vida cotidiana, produzido pelo estúdio Shaft, e que já conta com duas temporadas completas. A história tem foco no desenvolvimento de Rei Kiriyama, um jovem prodígio de shogi que se encontra sozinho depois de vários acontecimentos familiares. Entretanto, após entrar em contato com uma família de três meninas, ele tenta descobrir os motivos de suas vidas serem tão coloridas enquanto busca alguma razão para se motivar a continuar a fazer o que lhe trouxe tanto esperanças quanto desespero: ser um colegial profissional de shogi.
a teoria da iluminação
1. a luz no fim do túnel
Sempre que um dos personagens passa por alguma situação, ele se acende: ele revela parte de quem é de verdade. Assim, ele acaba revelando outras luzinhas em volta dele, ainda apagadas, as quais se acenderão conforme elas passarem por seus próprios conflitos: entretanto, já temos um vislumbre do que pode acontecer.
Ou seja, os conflitos não são nada mais do que formas de revelar coisas sobre pessoas. Na segunda temporada de Sangatsu no Lion, nosso personagem principal e seu antagonista estão em um vagão de trem, quando as coisas começam a ficar um pouco tenebrosas lá fora. A tempestade auxiliou na formação de um furacão que impede o trem de continuar. Após o sinal de evacuação, somente resta uma pessoa no trem, além de Kiriyama: seu ídolo e rival da última partida. Entretanto, como ele não tinha acordado naquele momento, com todas as vozes falando ao mesmo tempo?
Simples. Souya, o mestre de Shogi, antagonista e ídolo de Kiriyama, é também surdo, como descobrimos algum tempo depois.
Perceba que esse conflito (a interrupção do percurso de volta para casa) foi em um nível micro. Conflitos micro são aquelas pequenas faíscas que revelam partes interessantes da trama, como o fato de nosso Meijin ser surdo - o que traz consequências quando falamos sobre disputas e fama. Por outro lado, temos também os conflitos macro, que são eventos em grandes proporções que afetam grande parte do universo, como os acontecimentos iniciais na vida de Kiriyama, que contribuíram para ele se tornar quem é.
Usando esse exemplo, a gente pode chegar a uma definição um pouco melhor do que são conflitos e seu papel na narrativa. Quando estamos sob uma situação de pressão, por menor que seja, somos obrigados a tomar decisões o mais rápido possível para sair daquela situação desconfortável, como ver uma pessoa que você admira não reagir a barulhos altos enquanto dorme. Pensamos e nos comportamos de acordo com nossas crenças e valores, de acordo com o que achamos serem valores fundamentais, para que consigamos encontrar a melhor saída diante daquela situação (como chegar perto do seu ídolo? Como avisá-lo, se ele não te ouve? E se ouvir, como fazer dali em diante?).
Assim, na narrativa, um momento de conflito é justamente quando temos a oportunidade de empatizar com o personagem, pois estaremos vendo sua índole na forma mais pura. Não se trata de ter os mesmos valores dele, pelo contrário: um bom conflito vai te fazer pensar "é, talvez eu não fizesse isso, mas eu entendo porque ele fez" ou "talvez eu fizesse isso também", ou ainda "mesmo que eu não concorde com isso, talvez eu agisse dessa forma nesse momento".
Conflitos são, antes de tudo, uma forma de identificação do leitor com o personagem.
os quatro níveis de conflito
2. porque o buraco é mais embaixo
Porém, preste atenção. Isso não é uma escala de pior para melhor ou que significa que sua história só terá um tipo de conflito. Nada disso. A divisão em níveis é justamente uma forma de não fazer você criar personagens tão desinteressantes que fazem a gente desistir de acompanhá-los na primeira página, porque, sim, você pode fazer isso. Mas não vai. Porque se fizer... Ô, ferona, você não sabe o que te espera.
a. o nível físico
Quando seu personagem tem um limite material para ultrapassar, ele está diante de um conflito físico. O drama desse nível está focado nas limitações humanas e nas dificuldades que o personagem enfrenta para chegar a seu objetivo. Por exemplo, deficiências; cruzamento de longas distâncias, fenômenos naturais; forças sobrenaturais, como demônios ou zumbis são formas expressas do nível físico, porque precisam ser fisicamente derrotadas ou evadidas.
Em Estrela Morta, Brayan precisa empurrar pedras enormes durante seu treinamento, ou ainda, derrotar criaturas em cavernas após quase morrer algumas vezes, para sair dali. Esses são exemplos de conflitos com foco na dificuldade física de alcançar algum objetivo.
b. o nível social
Quando seu personagem precisa enfrentar um ambiente hostil, seja ele cultural, religioso, empresarial, econômico ou político, ele está de frente para um conflito social. Histórias desse tipo normalmente são focadas na opressão criada pela estrutura social, representando a busca do personagem por uma sociedade diferente, podendo exigir que ele se sacrifique em nome de uma causa. É uma disputa de poder entre o individual e o coletivo.
Em 1984, o protagonista, Winston Smith, percebe algo de errado com a sociedade em que vive e tenta lutar contra a opressão de um sistema que vigia todos, o tempo todo, em qualquer lugar.
c. o nível pessoal
Por exemplo, em várias histórias do Batman, o seu grande confronto é contra Coriga e sua teia do mundo do crime. O morcegão tem de encontrar maneiras de derrotá-lo ou aprisioná-lo, enquanto o palhaço faz a situação ir até os limites imagináveis.
d. o nível psicológico
Por fim, quando seu protagonista tem de lutar contra seus próprios desejos internos para alcançar algo, você tem um arco focado em níveis psicológicos. O enredo normalmente se foca no desejo entre o que o protagonista é e o que ele deseja ser, ou, ainda, entre seu Objetivo e sua Origem da Crença. Isso força seu protagonista-kun a reavaliar o que ele pensa, como age e o que deseja. Essa quebra pode, ou não acontecer, assim como todas as outras, dependendo do que você quer com sua história.
Em Sangatsu no Lion, temos um protagonista que está constantemente reavaliando sua motivação para jogar shogi; seu interesse em conhecer novas pessoas e até mesmo em manter antigas relações, tudo isso em uma relação nada confortável.
os tipos de conflito
3. afinal, não existe só um tipo de buraco
E estamos quase no fim!
Agora que já conhecemos todos os níveis, vamos dar uma olhada nos tipos de conflito. Eles se diferenciam dos níveis porque tratam não somente de categorias, como física ou pessoal, mas sim de entidades, como o personagem contra o ambiente ou contra si mesmo.
Ferona x Natureza: O personagem está sozinho em um ambiente hostil, este, natural. Ele deve coletar os recursos necessários para sobreviver ou até o resgate chegar.
Exemplos famosos: Far Cry Primal; O Náufrago.
Ferona x Sociedade: O personagem também está sozinho em um ambiente hostil, mas, neste, seus valores divergem da maioria das pessoas à sua volta. Ele pode buscar aliados ou refúgio para sobreviver ou uma rota para escapar.
Exemplos famosos: 1984; O Rei Leão, Min-D.
Ferona x Tecnologia: O personagem está envolto por uma sociedade constituída de autômatos, robôs ou qualquer tipo de máquina. Uma rebelião é iminente e ele pode buscar rotas para se aliar a eles, enfrentá-los ou fugir.
Exemplos famosos: WestWorld.
Ferona x Ferona: Dois personagens com valores diferentes se enfrentam em busca do controle de alguma situação. Eles podem buscar aliados para se fortalecerem. Um adendo: não é necessário que eles se enfrentem a história toda, o tempo todo. Seu personagem principal irá enfrentar vários indivíduos, inclusive grupos deles.
Exemplos famosos: Batman e Coringa; Estrela Morta, Kaii, A Borboleta na Tormenta.
Ferona x Si mesmo: O personagem está em constante luta contra o seu eu do passado e o seu desejo de ser no futuro. Há interação com outros personagens para direcioná-lo para um lado ou para o outro. É uma narrativa sem preto no branco, onde tudo pode mudar a qualquer momento, dependendo de como o personagem se posiciona.
Exemplos famosos: 3-Gatsu no Lion, Artemísia, A Chegada.
Ferona x Forças Extraordinárias: Há um grande foco na determinação do que é ou não real e no questionamento do personagem sobre a existência do personagem. Ainda que tente, ele pode, ou não, conseguir escapar de seu destino.
Não recomendamos a utilização desses conflitos.
Exemplos famosos: A Origem, O Show de Truman, Amnesia.
Não recomendamos a utilização desses conflitos.
Exemplos famosos: A Origem, O Show de Truman, Amnesia.
Agora você já entende como fazer um personagem complexo e conheceu diversas formas de colocá-lo para fazer alguma coisa de útil. Leia nossas postagens anteriores, estude textos parecidos (confira os exemplos e utilize-os como recomendações) e pratique. Afinal de contas, a gente não precisa de mais conflito Avaliadores x Feronas.
Dúvidas, críticas e sugestões podem ser colocadas no campo dos comentários! Alguma ressalva ou questionamento? Coloque aí que a gente faz questão de te responder, afinal de contas, comentários deixam a equipe muito feliz.
A penny for your thoughts.
Por acaso, se passar dos 7 dias do envio e não houver nenhuma resposta, é um mal sinal?(é o meu caso no momento)
ResponderExcluirOlá! Não importa se sua novel é boa ou ruim, ela sempre receberá uma resposta. Aguarde mais um dia e reenvie caso ainda não tenha recebido seu veredito.
Excluirporque não recomendam o conflito contra forças extraordinárias?
ResponderExcluirBoa noite, Afrânio! Bem, os conflitos contra as forças extraordinárias são aqueles com maior nível de dificuldade para que um bom desenvolvimento aconteça. Em poucas palavras: é difícil fazer funcionar legal. Uma prosa que carregue esse tipo de conflito pode facilmente ficar chata, monótona; viajada ou incompreensível. Assim, como raramente determina-se o que é real, o leitor pode ficar confuso e realmente não entender nada do que esteja acontecendo.
ExcluirPor isso é que não recomendamos que eles sejam utilizados: em uma novel, um romance, é necessária muita prática para que se consiga algo minimamente legível saindo dessa categoria.
Espero ter esclarecido a dúvida!
muito obrigado!
ExcluirObrigado pelas dicas.
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