No post anterior, você já entendeu o que raios é esse negócio de criatividade. Também já descobriu o porquê de não ter aprendido isso através dos meios convencionais e o motivo dessa palavra ser tão importante no mundo contemporâneo.
Agora chegou a hora de caminhar mais pouco e entrar no terreno baldio das ideias: bagunçado, confuso e extremamente interessante. Ficou curioso? Então já sabe o que fazer.
UMA NETWORK DE IDEIAS
A liberdade é o melhor lugar para exercitar a criatividade.
Ideias nada mais são do que amontoados de informações combinadas de formas diferentes. A criatividade, o conjunto de ideias inovadoras, então, diz respeito a existência de novas ideias – logo, novas combinações de informações. Por exemplo:
O elefante é azul – associação da noção de elefante com a noção de cor azul, visto que elefantes podem apresentar cores.
O elefante é grande — associação da noção de elefante com a noção de tamanho (grande), visto que elefantes podem apresentar tamanho.
O elefante é uma cadeira — associação da noção de elefante com a noção de... cadeira? Visto que elefantes podem apresentar... o que um elefante pode ter em comum com uma cadeira?
É justamente aí que a criatividade entra. Quando você força seu cérebro a tentar encontrar algum padrão entre noções aparentemente distintas, você concebe uma ideia inovadora. É justamente por causa desse estímulo diferente que a originalidade — ou quase, a gente pode falar disso uma outra hora — acontece. Vamos trazer isso um pouco mais para perto da gente.
Metáforas, quando bem feitas, são geniais. O capítulo “O velho diálogo de Adão e Eva”, de Memórias Póstumas de Brás Cubas, é um exemplo disso. Através da pontuação, Machado de Assis conseguiu passar a cena da maneira que gostaria. E ao me referir à pontuação, é realmente um capítulo todo somente com pontos. Saca só.
Quando você pôde imaginar que veria algo assim? Pois é, o autor fez uma associação de informações: tons de voz + pontuação + sons da pontuação, criando um dos capítulos mais legais que eu já li.
Então, ideias funcionam como uma grande rede, conectadas umas às outras. Quanto mais informação você tiver, mais redes conseguirá criar. Mais elefantes-cadeira serão possíveis e parecerão cada vez menos estranhos.
A IMPORTÂNCIA DE NÃO SER SOMENTE UM AUTOR
Transformar o pouco de muito em muito para muitos: essa é sua missão.
Imagine que esteja concebendo um livro de mistério. Seu personagem principal é um detetive pouco famoso na região que precisa decifrar um caso perigoso e, assim, conseguir fama e reconhecimento. Você, então, ajusta o resto do esqueleto narrativo e vai escrever. Porém, no meio do segundo capítulo, se depara com um problema: como detetives trabalham mesmo?
O conhecimento de outras áreas acaba sendo essencial quando precisamos exercitar a criatividade e essas associações de ideias. No último post, eu disse que você não foi/está sendo ensinado a ser criativo, porém, de certa forma, você está — só não sabe. Quando vai ter aula de Química,
“Mas o que eu estou fazendo nesse lugar? Para que eu vou usar isso na minha vida?”
Então, ferona, você pode acabar usando em sua história sobre detetives, em que é necessário saber a meia-vida de um determinado composto para saber desde quanto tempo aquilo está ali. Ou pode pegar aquele conhecimento aparentemente inútil de Matemática e transformá-lo em algo útil para seu personagem que é um gênio e precisa demonstrar isso. Ou também aquelas aulas chatas de Literatura e entender de primeira a referência ao Machado que fiz na primeira parte do post. E é claro que isso não se resume somente à escrita: o mundo pede por pessoas que não saibam somente uma coisa, mas saibam um pouco de tudo.
Em síntese: nenhum conhecimento é completamente inútil. O que difere a utilidade da inutilidade é como você utiliza o que sabe — ou deveria saber.
UM QUASE PROCESSO CRIATIVO: PREPARE-SE E ACORDE
Organização é saber onde cada coisa poderia estar — e fazer melhor.
Então, antes de qualquer coisa, fuja das distrações. Coloque aquela música que gosta tanto e comece a avançar. Feche a porta e, se for necessário, pendure uma plaquinha de "Interditado". Seu momento de trabalho é precioso demais para ser gasto com vídeos aleatórios de gatinhos ou notícias que você não está dando a mínima. Só tome cuidado para não parecer muito rude.
Assim, os únicos motivos para você não começar a buscar informação são: não saber onde procurar ou ter preguiça de fazê-lo.
Por isso é essencial que acorde para a vida e perceba que você está lendo esse post na internet, logo, tem a maioria das informações ao seu alcance! Juntamente com o que já sabe, fica bem mais fácil prosseguir nessa empreitada criativa. Quando tem certa noção de Química, entender o que pesquisou fica bem mais fácil. E quando sabe o que vai fazer — planejou sua obra —, as coisas começam a ficar cada vez mais legais pro nosso lado.
Dessa forma, agora você detém tudo o que precisa para sua história. Só tem um problema: você tem tudo o que pesquisou.
Falta organizar essas ideias dentro do seu esqueleto narrativo, se perguntando: como posso usar isso? Será que isso é realmente viável? Essa ideia com essa aqui pode virar um capítulo bom?
Esse processo acontece tanto quando estamos cientes disso, forçando seu cérebro, como já conversamos, como também inconscientemente, de modo que elas parecem se misturar e você cria uma obra-prima da literatura do nada — ou cai da cama.
UM QUASE PROCESSO CRIATIVO: DURMA E VERIFIQUE
Kant, Locke, Hobbes, Descartes.
Agora você já tem suas ideias incubadas e prontas para virem ao mundo, seja na forma de uma noite em claro tomando café ou no caminho para casa. Esse é seu insight, seu momento de iluminação: nada mais do que o processamento de ideias que já tinham sido pesquisadas, escolhidas e selecionadas; só restava misturar e fazer acontecer.
Porém, nem tudo o que você pensa faz algum sentido quando colocado no papel. Se antes a pergunta era “como posso usar”, agora o questionamento cai em cima do “Se eu usar, fica realmente aceitável dentro do que eu planejei?”/”Será que ela resolve o meu problema com esse personagem e é a melhor opção?”. É aqui onde ocorrerá a verificação das ideias, aproveitando para dar aquela última pesquisada para ver se tudo está de acordo com o mundo real ou planejado pelo autor.
Todavia, talvez as coisas possam parecer um pouco confusas. Pode ser que nenhuma delas pareça boa e que tudo não passou de um desperdício de tempo e energia. Pode ser que você comece a se questionar sobre o quanto você é realmente bom naquilo que está fazendo e se, quem sabe, talvez não fosse melhor tentar a rota tradicional.
Mas se você chegou até aqui, pelo menos um pouco de convicção possui. Então, se isso acontecer com você, dê um tempo. Vá espairecer. Vai jogar vôlei, assistir aquele anime que deixou de lado, comer um lanche com os amigos. Lembre-se que tudo é informação para você: não será tempo gasto, mas tempo investido.
Por fim, não seja tão duro consigo mesmo – nossos revisores já farão isso por você.
Cada capítulo finalizado, cada ideia de personagem e cada insight é um motivo para se sentir um pouquinho mais feliz. Sempre que possível revisite suas ideias escolhidas, veja se não está deixando passar nada que pode usar agora e que não podia antes.
E quando você sentir que acabou, quando sentir que pode mostrar essa obra para o mundo, é hora de fazer aquela última revisão e clicar no “enviar”.
Então...
Confira no próximo post.
A penny for your thoughts.
MUITO BOM! SHOW! isso citado sobre colocar no papel e não se parecer com o que você imaginou, me descreve todo dia quando acordo cedo para escrever e leio o material
ResponderExcluirObrigado, Douglas! Fico muito feliz que tenha se identificado. Isso é parte do nosso processo criativo; o importante é não parar de criar e recriar.
ExcluirA história perfeita não é aquela que é escrita de uma vez; mas aquela na qual o autor trabalha até alcançar o que deseja. Então, bora seguir adiante!