Dizem que, quase melhor do que aprender com os próprios erros, é aprender MAIS AINDA com os erros dos outros. O Caçadores de Reprovações foi bem recebido e continuará sendo o seu quadro mensal de revisão do My Light Novel, desde pontuação até narração, utilizando trechos de pérolas reprovadas. É lindo: você aprende com seus erros enquanto ri dos erros dos outros!
O CR de hoje está focado em vírgulas, parágrafos e descrições. Partiu descobrir os erros mais comuns e aprimorar sua escrita? Então pega sua bolacha de maizena e seu suco de maracujá: as novels já estão na mira!
1. PROBLEMAS CENTRALIZADOS & DESCRIÇÕES PROBLEMÁTICAS
O parágrafo inicial desse primeiro texto é uma coisa interessante a analisar, levando em consideração que é o primeiro parágrafo do que se pretendia ser uma obra completa. Quando o autor diz que "gemidos vinham de um beco ao lado de um bar", está dando a entender que a história começará no beco, afinal, o conflito parece surgir justamente da situação que se passa lá. Porém, uma vírgula depois, temos que "na portava estava um jovem barman": becos não tem portas. Mas bares, sim.
Quando você inicia um parágrafo, a estrutura comum a ser seguida é apresentar o ponto central dele logo na primeira frase para que o leitor saiba o que encontrar pela frente. Um parágrafo que se inicia com uma descrição do que acontece em um beco vai levar, irremediavelmente, ao pensamento de que a história começará neste lugar. A quebra de expectativa em casos assim não é nada legal: induzir o leitor a imaginar uma situação e forçá-lo a reformular seu pensamento é desgastante e tira a esperança em uma continuação relevante. Porém, continuemos.
O segundo core do parágrafo é basicamente descrição-roteiro. Na maioria das vezes, as descrições-roteiro seguem a fórmula de [característica de idade/idade] + [altura] + [cabelo] + [roupa] + [detalhe estético qualquer]. Escritores iniciantes tem a mania de levar a dica de "Crie uma ficha de RPG para seu personagem" muito a sério, resultando em descrições desse tipo. Quando dizemos para você criar esse tipo de coisa, é para que possa conhecer mais do seu personagem, não para jogar todas as informações no meio da trama porque ninguém vai se lembrar depois e você vai ficar muito frustrado ao perceber que ninguém está concebendo seu personagem do jeito que você queria e achar que o problema está no leitor, não na sua incompetência de se colocar no lugar de um leitor da sua própria história.
Em suma: ainda que o autor tenha utilizado alguma metáfora (brancos como a neve [que já está mais batida do que suas roupas de dormir]) e comparação (como os de um sapo), de nada vale se todo o resto é pura estética que não importa. Diálogos e descrições precisam possuir alguma utilidade, do contrário, não se fazem necessários à história e podem ser retirados sem problemas.
Passando o segundo parágrafo com mais informação jogada e que ninguém está dando a mínima porque não foi mostrada a relevância do fato, chegamos ao terceiro parágrafo desse fragmento. Fora os problemas descritivos já citados, temos o curioso trecho: "o outro estava um pouco afastado dela, mas portava uma adaga que girava em sua mão". Você pode imaginar que um homem segurava uma adaga, rodando ela por entre os dedos. Ou você pode imaginar uma adaga que gira como uma beyblade. Essa descrição está causando esse efeito de duplo sentido porque o autor está tentando, mais uma vez, encher sua narrativa de conceitos desnecessários. Em vez de ele dizer que "o outro (...) portava uma adaga que girava em sua mão", poderia simplesmente dizer que "o outro (...) girava uma adaga em sua mão/por entre os dedos". Afinal, se ele está com ela em mãos, está implícito que ele a está portando, sem necessidade de repetir a informação.
Bem, a narração deixou de estar no pretérito do indicativo (foi, disse) para começar no pretérito do subjuntivo (iria, diria). Depois, ela muda novamente para o presente (responde). Então, depois ela volta para o pretérito do indicativo (continuavam, continuou). E para o presente (responde, aponta). Em síntese: o autor provavelmente só foi escrevendo as coisas como as imaginava, sem prestar atenção na unidade do texto. E, mais pra frente, sequer deu uma lida básica para corrigir esses problemas mais aparentes. Falta de revisão e olhar crítico do autor faz perder muitos pontinhos.
E se as descrições já não estavam muito legais ("faz posição de corrida"), os diálogos só confirmaram nossa ideia de que o autor é muito jovem, está escrevendo pela primeira vez e tem uma bagagem extremamente limitada. Primeiro que não se deve, nunca, colocar um diálogo entre colchetes. Segundo que não se deve, nunca, em uma prosa, colocar o nome do personagem antes da sua fala: Light Novel não é roteiro! E, terceiro: qual é a finalidade de dizer:
"Yuu? Também é de Harama, enfim, Level up..."
Ninguém fala dessa maneira. E qual a relevância de saber que fulano de tal é de Harama? Ainda mais nesse momento?
Certo, agora sabemos que "Level Up" é uma das skills do personagem e que ela provavelmente aumenta sua velocidade, já que ele está correndo bastante. Mas, novamente, temos o velho problema da ortografia: avia (havia), saco (sacou), embanhada (embainhada). E a oscilação de tempo verbal dá as caras novamente, com corre, sacou, coloca.
A influência de jogos na narração é nítida. Porém, até o momento, não foi dada nenhuma pista de que se trata realmente de um jogo. Caso não o seja mesmo, é muito mais interessante utilizar termos como habilidade no lugar de skill. Se houver correspondente na nossa língua e o contexto permitir sua utilização, é mil vezes melhor fazê-lo: você está escrevendo em português, afinal de contas!
E, mais uma vez, podemos atestar que o autor não tem confiança em sua narrativa. Ele faz questão de descrever personagens e ações em miúdos, repetindo informações. Agora, no excerto corrigido:
Hoje é meu dia de sorte. Imagina a recompensa por matar o "Coração Friorento"...
Essa era a alcunha de Yato no reino.
Ele o faz de novo. Pelo contexto, conseguimos saber que esse é o apelido de Yato por dois motivos: ele soltou um bafo gelado depois de usar sua habilidade e existe um ladrão querendo matar um mocinho. Dizer que aquele era o apelido do personagem é bastante redundante e, assim como algumas das outras descrições desse texto, uma perda de espaço.
Postagens recomendadas para o Coração Friorento e Centralizado:
Ortografia: Dicas Rápidas da Tany
Pontuação: Como pontuar diálogos
Diálogos: Dicas Básicas
Enredo: Bingo de clichês
2. PARÁGRAFOS MISTOS & VÍRGULAS POR DEMAIS
Diferente da obra anterior, esta apresenta um primeiro parágrafo mais introdutório e com pouca descrição acerca do personagem principal. Na verdade, desta vez, começamos o texto uma contextualização espacial: o autor descreve o lugar que está em volta do personagem e que, possivelmente, permeará grande parte desses momentos iniciais. E aí chegamos no verdadeiro problema que precisamos ressaltar com esse exemplo: a confusão de informações.
Novamente, retomamos aquela conversa sobre a primeira frase determinar o que será dito no parágrafo. Na verdade, essa primeira frase do parágrafo tem um nome: tópico frasal. O tópico frasal vai da primeira letra maiúscula até o primeiro ponto final, na maioria das estruturas. Ele pode vir no final também, mas aí é um caso que prefiro que você não tente fazer ainda. Utilizar a estrutura crua é o primeiro passo para modificá-la depois.
Temos, então, o tópico frasal do segundo parágrafo:
"A mensagem aparece no canto inferior esquerdo, leio-a e avalio o cenário, o lugar é formado por estruturas geométricas; quadradas, retangulares, cilíndricas."
É um tópico frasal ruim? Mais ou menos. Verificar isso aqui é legal porque demonstra que os diversos fatores da nossa Avaliação estão mesclados uns com os outros, se influenciando continuamente. Parece um pouco abstrato, mas repare só.
Há muitas vírgulas em poucas linhas (é um problema que você já pode ter percebido pelas marcações em azul espalhadas pelo documento). Fazer isso é muito comum entre escritores iniciantes, movidos somente pelo seu fluxo de pensamento. Com muitas ideias na cabeça, acabam apertando a vírgula e encadeando diversas informações, mesmo que depois elas não tenham grande sentido como unidade.
Por exemplo, a partir da segunda vírgula, o autor está movendo o foco da mensagem de [mensagem] para [personagem] para [lugar]. O protagonista da informação não é mais o que acontece com a mensagem, mas sim o que tem naquele lugar. E sempre que isso acontecer, o ponto final acaba sendo mais bem-vindo que a vírgula. Assim, podemos modificar esse tópico frasal para:
"A mensagem aparece no canto inferior esquerdo: leio-a e avalio o cenário."
E as três primeiras linhas da história ficam:
"Veins, base das máquinas, entrada do núcleo."
A mensagem aparece no canto inferior esquerdo: leio-a e avalio o cenário. O lugar é formado por estruturas geométricas; quadradas, retangulares, cilíndricas.
Olha só, temos um período um pouco melhor. Vamos ver o que dá para fazer com esse conhecimento que a gente já tem. Sabemos que utilizar o ponto no lugar da vírgula é uma opção melhor quando há mudança de foco na mensagem, mas e quando é o mesmo foco? É aí que as vírgulas podem se tornar mais traiçoeiras: você pode acabar separando o sujeito do predicado, como o autor acabou fazendo em: "Cada uma dessas formas (sujeito), contem (verbo) desenhos complexos (predicado)". O restante dessa frase tem o mesmo núcleo, então as vírgulas se tornam até descartáveis.
Então, temos o mesmo problema da novel anterior reaparecendo por aqui: as descrições confusas e repetitivas. No caso passado, elas eram fruto de inexperiência com descrições e relaxo de revisão, agora elas parecem mais consequência do autor não saber como utilizar vírgulas e articular o pensamento. Esse ferona repete diversas vezes a informação do movimento dos dedos e se preocupa com a minúcia descritiva do movimento de ativação do rifle, mas, de verdade, qual é a relevância disso? Não há muito o que trabalhar em cima, a não ser que a situação fosse o personagem não sabendo manejar um rifle. Mas como sabe, demonstrar seu conhecimento enquanto escritor e admirador de armas é desnecessário. Ou, ainda, temos descrições como:
"Meus olhos encontram o chão, de joelhos, minha mão toca a superfície, e concreto, eu acho."
Vamos lá. Você já sabe como deixar esse período melhor sozinho, mas vou te dar uma mão: essa frase tem três focos de mensagem e também um erro de ortografia. Agora, fica como lição de casa corrigir essa frase — poste nos comentários e veja se acertou! As outras marcações com sublinhado são frases que não apresentam tanta relevância e poderiam ser modificadas ou removidas totalmente.
Finalizando esse parágrafo, temos algumas sugestões de mudança. No excerto: "Uma arma, um rifle antimatéria, modelo Sterys HS .50, a qual renomeei e decidi chamá-la de The God Destroyer (...)", temos dois jeitos diferentes de se referir ao objeto: arma e rifle. Sempre que você for descrever algo após ter utilizado mais de um jeito de se referir a ele, é preferível usar como referência o último jeito de descrever utilizado. Ficou confuso? Veja:
Em vez de dizer, concordando com "Uma arma", o objeto mais longe: "Uma arma, um rifle antimatéria, modelo Sterys HS .50, a qual renomeei e decidi chamá-la de The God Destroyer"
Você diz: "Uma arma, um rifle antimatéria, modelo Sterys HS .50, o qual renomeei e decidi chamá-lo de The God Destroyer", concordando com "um rifle", o objeto mais próximo da descrição.
A marcação azul em "Levanto a tampa frontal e traseira da luneta" também é uma sugestão, mas essa é bem opcional. Em vez de concordar com somente um dos termos, pode haver a concordância com os dois. Ou seja, "Levanto as tampas frontal e traseira da luneta". Parece estranho, mas faz tão sentido quanto o meio convencional.
E, por fim, no trecho "Do bolso da camisa, retiro um lenço e começo a limpar a digital, guardo o lenço e olho através da luneta mais uma vez.", há uma repetição bastante chata de retirar lenço/guardar lenço. Em vez disso, pode-se mudar a informação para:
"Do bolso da camisa, retiro um lenço e começo a limpar a digital. Depois, olho através da luneta mais uma vez."
A ação de guardar o lenço fica implícita e não polui a narrativa.
E, guardando o maior problema para o final: você reparou como esse parágrafo tem muita informação junta? Falamos sobre cenário, sobre rifles, sobre menus, sobre renomeação de item e até sobre limpar lunetas. Na verdade, o problema central desse parágrafo é que ele reúne muita informação: cada um dos grandes núcleos devia, na verdade, ser um parágrafo próprio, com estrutura definida e informação própria.
Agora começamos com os diálogos. Em si, eles não apresentam muitos problemas. Na verdade, o problema principal está no que vem depois deles: na pontuação e nas descrições de diálogo. Já citamos isso no CR1 e temos uma postagem dedicada somente a esse tema, portanto, se ainda não domina esse aspecto, dá uma conferida lá e depois tente descobrir o motivo dos verbos depois dos diálogos estarem grifados de vermelho.
O último diálogo é um tanto quanto problemático. Vejamos o motivo.
– Ou seja – ouço uma “nova” voz através do com– link, procuro– a com minha luneta, vejo um avatar feminino, a paleta de cores inteira está em seus cabelos. a pele branca, os lábios rosados, um nome aparece sobre a cabeça dela, Shiki. –, O Guardião só começara a nos atacar, – quando fizermos algo contra ele – reparo em seus equipamentos, todos tem a cor opaca, ela está usando um colete à prova de balas, luvas e coturnos. uma metralhadora UMP .45, repousa sobre seu busto, e um rifle M4-A4 pende em seu ombro. – mas da pra acreditar que, desde o lançamento do FOG, nenhum grupo conseguiu derrotá-lo?! Ah, e eu li o que um jogador postou no fórum, ninguém tem a menor idéia do que fazer contra essa coisa! um deles relatou que morreu com um único golpe!
Primeiro: o autor mistura descrições de contextualização (no caso, de estética) com o texto pós-diálogo, normalmente destinado a ações que vêm junto com o diálogo. Mas esse não é o real X da questão: quando você precisa colocar vários diálogos da mesma personagem falando, quer dizer que algo não está muito correto. Uma solução seria excluir uma parte deles e juntar a parte realmente relevante, desmembrando as descrições em um parágrafo separado (caso falar a roupa da personagem e seu tipo de arma seja realmente necessário.
Mostrando que não revisou seu texto antes de encaminhá-lo, o autor ainda deixou passar diversos termos grafados com letra minúscula e que deveriam começar com maiúscula, por exemplo em "Não esses status, seu idiota! o (minúsculo, deveria ser maiúsculo) do Chefão!". E, ainda, algumas palavras estão com pontuação inadequada (começara/começará; da/dá; idéia/ideia).
Quanto às notas de rodapé, é preferível que elas não existam. Em vez de dizer que Dinks é a moeda do jogo somente lá embaixo, o autor poderia não ter colocado essa informação; no trecho em que esse termo é utilizado já dá para entender que se trata da moeda do jogo. Quando à Party, a utilização do próprio termo é questionável, já que Grupo é um bom correspondente em português.
Postagens recomendadas para o Rifle de Vírgulas
Ortografia: Tempo na Narrativa
Pontuação: Vírgulas
Descrições: Alguns tipos e subtipos
Diálogos: Reforço de diálogos
Narração: Parágrafos
Bônus: Leia Brasileiros!
Críticas, comentários e sugestões são especialmente bem-vindos! O que achou do quadro novo? Tem alguma coisa para falar sobre os textos? Achou algum erro que você também pode estar cometendo? Sinta-se livre para comentar!
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