Presa na noite de Natal. Sozinha no
escritório do My Light Novel. Bem, ao menos tenho a máquina de café para me
fazer companhia... meus colegas de trabalho já foram embora há horas, e só eu
fiquei, para variar... sabe, talvez fosse realmente melhor se eu me demitisse.
Esse trabalho cansa. Quer dizer, eu me olho no espelho e só vejo as olheiras
se acumulando cada vez mais, cadê a recompensa de boa funcionária?!
— Mas acho
que para ninguém aqui é fácil, olha só essa pilha de novels para corrigir em
pleno natal, separadas todas em categorias diferentes... acho que são os pontos
a corrigir ainda. Deixe-me ver, normalmente eu nem me atreveria a tocar nisso,
mas já que não tem ninguém aqui mesmo...
Passo de
mesa em mesa lendo as placas que continham os pontos a serem corrigidos.
—
Ortografia, pontuação, descrições, diálogos, narração... enredo? Interessante. —
Olho em volta para ver se não tinha ninguém me observando mesmo.
Pego a
primeira novel da pilha, leio a primeira linha e foi como se algo tivesse me
atacado...
— Ah! — Caio
no chão, ofegante. — Em nome de tudo que é bom, o que foi isso?! É sério mesmo?
Como eles conseguem? Onde estão os óculos de proteção quando se precisa
deles...
Levanto no
chão me recompondo, olho para a mesa de novo e vi um par de óculos diferentes,
um daqueles de ampla visão usados em laboratórios e em áreas de risco em cima
dela com um aviso, ali dizia:
Leio esse
aviso com uma das sobrancelhas arqueadas. Coloco os óculos e volto a abrir a
novel. No mesmo instante, faço uma cara feia.
— Como
alguém consegue escrever tão mal? Escreveu “o que” junto, um monte de vírgulas
erradas, erro de crase, falta de concordância verbal, notas de qualidade
indicando “ruim”, “mediano-ruim”... enredo com potencial? Espera aí, não é
possível.
Começo a
folhear a novel, a história é, adivinhem? Sim, um isekai, mais outra história
sobre um garoto transportado para outro mundo. Mas essa é diferente, é mais
séria, tem temas pesados no meio, uma pitada de suspense, mistério e até mesmo
bons personagens. Se não fosse pelos problemas tão básicos de português... será
que ela seria aprovada?
— Bom,
acho que é isso, deixa eu ver essa. — Leio o título, escrito completamente em
japonês. Ao menos era o que tentava parecer. Meu rosto se contorce em agonia ao
ler aquilo. — Tá, próxima... essa aqui parece menos ruim.
Pego a
terceira novel da pilha, dessa vez, antes de abrir, vou até a máquina de café,
preparo um expresso e me sento para ler.
— A parte
de enredo diz que não tem potencial, por que será?
Abro na
primeira página e começo a ler. A cada parágrafo, eu não consigo acreditar no
que meus olhos enxergam, mesmo usando os óculos, ainda é de doer a vista. A
narração da obra não é nada boa, é confusa e fica dando voltas em si mesma o
tempo todo, os personagens são fracos, sem graça, com diálogos horríveis, além
de uma história bem meia boca. Não que eu já tenha escrito algo de relevância,
mas, sério, que coisa ruim. Eu parecia a Kaguya de “Kaguya-sama: Love is War”
naquele gif dela segurando o café e tremendo que nem doida.
Falando em
Kaguya, eu estava na mesa dela. Achei melhor sair dali antes que derramasse o
café, então achei melhor ler na mesa do Kyn mesmo.
— Ah, café
quentinho é tudo de bom — digo com um tom de conforto enquanto tomo mais um
gole. — Mas sério, ficar presa aqui... no Natal ainda, e na véspera no meu
aniversário? Por que essas coisas só acontecem comigo?! Aaaaah!
Fico de
bruços na mesa, resmungando para o nada.
— Será que
tem algo de bom para fazer por aqui? O que será que tem nas gavetas deles? Já
vi o Kyn escondendo coisas suspeitas aqui antes... — Abro a gaveta do Kyn e
encontro um...
— Um pato
de borracha? Eu já devia suspeitar... O que mais tem aqui? Hum, uma pasta, o
Kyn carrega uma pasta por aí?
Abro a
pasta, de dentro dela saem várias folhas, com a primeira delas contendo o
título “planos para Feijoada e Afonso”. Fico confusa com aquilo, não faz o
menor sentido sem o contexto necessário, mesmo assim continuo a mexer nas
coisas dele.
No demais,
só tem coisas básicas de escritório e nada que chamasse demais atenção, exceto
por um canetão verde de uma marca que eu nunca vi antes. Coloco tudo de volta
no lugar, mas, quando vou guardar o pato, escuto algo, algo vindo dele, parando
para prestar a atenção, é possível sentir algo vindo de dentro dele, então,
usando todo o meu bom senso e a calma que há no âmago do meu ser, pego um
estilete e abro o patinho.
Pensar que
esse pato é o Kyn torna esse ato um pouco menos cruel na minha mente.
— Oh, um
bilhete? Todo amassado... deixa eu ver, aqui diz... Hã? “Vá ao banheiro?”
Como
estava sem absolutamente nada para fazer, apenas sigo em direção ao meu novo
destino. O banheiro do MLN é simples, uma privada, uma pia, nada demais, mas
agora, o que é para eu fazer ali, hein?
— Sério,
eu vou muito pedir um aumento ano que vem, primeiro, por me largarem aqui e me
deixarem vivendo apenas na base de café expresso, segundo, porque eu não
aguento mais resolver enigmas desses meus chefes... será que isso conta como
abuso de autoridade ou algum tipo de ilegalidade no trabalho?
Olho em
volta do banheiro, tudo parece normal, então apago a luz, nesse momento, enxergo
algo escrito na parede, como se só pudesse ser visto no escuro, não sei como
colocaram aquilo ali, mas o que mais me chama a atenção é o que está escrito.
Olhe embaixo da pia
Faço isso,
debaixo da pia, há um bilhete grudado nela, puxo ele, nele estava escrito:
Manda quem pode, obedece quem tem juízo, sua última ordem precede
sua próxima ação
PS: Não, Célia, não podemos te dar um aumento.
— É sério?
Quem foi que escreveu isso? Tá, deixa quieto, só me deixa pensar... O Vong me
pediu pra dar uma olhada na cafeteira antes... Hum, vamos lá.
E lá vou
eu, seguindo as pistas que encontro, acho que realmente deveria parar de
aceitar esses enigmas, com esse já foram dois só hoje... Chegando à máquina de
café, não tem nada de anormal sem um olhar mais atento, então resolvo fazer
outro café. Está tudo bem, até que a máquina resolve parar de funcionar.
— O quê?
Eu achei que tinha resolvido o problema. Mas que droga! Sem café, cansada,
sozinha, com fome, querendo jogar Genshin Impact e perseguindo pistas estranhas
que não me levam a lugar algum! Grande dia, Célia, grande dia...
Apenas decido
voltar ao meu computador e ver se alguém está online para eu pedir socorro.
Chegando lá, vejo que tinha uma mensagem nele, de destinatário desconhecido,
mas só diz:
APAGUE
AS LUZES À MEIA NOITE
Aquilo me
deixa meio sem reação, alguém com certeza está brincando comigo, mas, ao mesmo
tempo, eu tinha uma ponta de curiosidade que me fazia querer continuar. Olho
para o relógio, são 23:59, quase no horário informado. Corro para o
interruptor, e assim que o relógio vira...
Ouço um
barulho alto de explosão. Viro o rosto para a janela, assustada, e o que vejo é
incrível. Um céu noturno cheio de cores, produzidas por fogos de artifícios, de
todos os tipos.
— Uau, não
sabia que soltavam tantos fogos no Natal aqui, não conseguiria ver nada do meu
apartamento. Que... bonito.
Nessa
hora, ouço um barulho de chave, a porta finalmente é aberta. Uma surpresa e
tanto.
— E aí,
Célia, gostou dos enigmas? — fala o Vong.
— Pois é,
deu o maior trabalho arranjar tudo e deixar preparado — diz o pato.
— Peço
desculpas, Célia, esses três quiseram muito fazer essa “lição de Natal” pra
você. — Joaquim se desculpa insistentemente.
Eu apenas
olho para a chefa, com cara de satisfeita, e pergunto:
— Tany, o
que diabos foi tudo isso? Sério, não foi nada legal, mas um segundo e eu
poderia ter jogado um estilete em vocês!
— Célia,
calma — diz ela. — Isso foi só uma
brincadeira, estávamos testando você esse tempo todo. E, além do mais, não foi
tão ruim assim, vai? Olha pra trás, vai dizer que os fogos não te
impressionaram?
Eu coloco
as mãos no rosto e respiro fundo. Estou pronta, é a hora de pedir demissão.
— Eu quero
dizer uma coisa. Eu me dem-
— Antes de
você dizer isso, tem uma coisa que queríamos te dizer. Obrigado por tudo, de
verdade, é muito bom ter você conosco há tanto tempo. Raramente se acha pessoas
de confiança como como você hoje em dia, pedimos desculpas pelos problemas que
causamos a você todos esses anos, Célia, prometemos que vamos tentar melhorar.
Aquelas
palavras são como um soco, não acredito que eles realmente se desculparam, fico
perplexa e atônita. E, novamente, antes que eu pudesse dizer algo, Kyn começou
a falar.
— Ah,
trouxemos comida! Vem, vamos comer! Achou mesmo que deixaríamos você aqui
assim?
A menina
nova, Kaguya, chega logo atrás deles, com a Cecília. Elas carregam um carrinho
com salgadinhos, refrigerante, café, doces e... no centro de tudo, um bolo
natalino com velinhas e meu avatar.
— Feliz
aniversário, Célia! — dizem todos em conjunto.
Nos
reunimos na mesa de reuniões, e começamos a comer, enquanto conversávamos e
comíamos, só uma coisa passava pela minha cabeça. Essa equipe, esse lugar,
apesar de tudo, me sinto grata e afortunada por estar aqui hoje, obrigada pela
comida, pessoal, e por esse Natal, de todo o meu coração.
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Eu adorei o especial! E esse final, Célia finalmente foi recompensada! o/
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